quinta-feira, 21 de junho de 2012

Dinossauro

Um:
Já é quase todo de mentira.
Dente de resina, tubo de plástico pra ser traquéia, uma máquina é que respira.
Em vez de rótula, pino, em vez de osso essa massa esponjosa.
O coração só bate quando é lembrado por um remédio colorido.
Até o rim veio emprestado de uma menina morta.
O corpo todo já desistiu, só as sinapses insistem.
 O aparelho no labirinto é pra ouvir qualquer coisa dos que vivem de verdade: ele finge.
Outro:
Chega esbaforido, tem pressa.
Tudo nele é de verdade e músculo.
Gordura, fluidos, vesícula, garganta, cuspe. Ele engole. 
Suas células gordas se reproduzem como se fosse pra sempre.
Este homem funciona sozinho.
Assim, desobrigado de existir, ele pode até ter sentimento e tem:
“coitado desse velho".
Distraído de funcionar, o homem verdadeiro pode pensar em tudo, até em usar um boné.
O homem de mentira então arrasta o dedo pro buraco na garganta e inventa uma voz metálica.
-       Tira esse boné pra falar comigo, moleque. Me respeita.
O homem de mentira não tem mais corpo nem tempo, mas esbanja história e exala genética. Alguém duvida da força de um dinossauro?
O homem de verdade então cala e entende o seu tamanho: ele vai ser sempre pequeno como um filho. 

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